Category Archives: Discografia Comentada

Os cinco melhores discos de Maysa

Segundo o blog Maysa Monjardim Oficial. Concordei geral, só senti falta do ao vivo de 1964 com Eumir Deodato, lançado pela Elenco com aqueles olhos em preto e branco na capa.

1) Ando Só Numa Multidão de Amores (Philips, 1970)

Além de um repertório bem escolhido, o que chama a atenção é a segurança e as diferentes nuances da voz grave e rouca de Maysa, que em algumas faixas como “Chuvas de verão” e “Quando chegares” abusa da sensualidade e do intimismo.

2) Maysa (RCA Victor, 1966)

Talvez este seja o disco em que Maysa mais expõe sua versatilidade – da balada jazzística “Just in time” ao samba clássico “Tristeza”, passando pelo maior afro-samba de Baden e Vinicius: “Canto de Ossanha”.

3) Convite Para Ouvir Maysa Nº 2 (RGE, 1958)

Um repertório escolhido com primor, 4 novas composições de Maysa e 7 outras interpretações, todas orquestradas pelo maestro Enrico Simonetti, que também assinava os arranjos e a regência do disco. Ali estava a canção “Meu mundo caiu”, tida como o maior sucesso de toda a carreira de Maysa, além de outras canções que se tornariam clássicos, como “Por causa de você”, “Bronzes e cristais”, “Bom dia, tristeza”, “Felicidade infeliz”, “Bouquet de Izabel” e “Diplomacia”.

4) Barquinho (Columbia, 1961)

Em seis faixas Maysa foi acompanhada pela orquestra Columbia, e em outras seis, por pequeno conjunto (Roberto Menescal, Bebeto Castilho, Luiz Carlos Vinhas e Hélcio Milito). O disco foi um verdadeiro marco na carreira de Maysa, não só por representar uma comunhão com a Bossa Nova, mas representava também um novo jeito de cantar, novas nuances, novos contrastes, o verdadeiro ritmo da inovação.

5) Maysa Sings Songs Before Dawn (Columbia, 1961)

Gravado nos estúdios da Columbia Records norte-americana, no inverno de 1960 em Nova York, durante a temporada de Maysa nos Estados Unidos. (…) O repertório do disco é basicamente formado por canções estrangeiras, principalmente releituras de grandes clássicos, como “You better go now”, “The end of a love affair”, “Mean to me”, “I’m a fool to want you e “The man that got away”. Músicas do repertório de grandes estrelas como Billie Holiday, Judy Garland, Chet Baker e Frank Sinatra. Maysa também é acompanhada pela orquestra de Jack Pleis.

João Gilberto disco-a-disco

Onze álbuns gravados em estúdio e metade disso ao vivo – cinco e meio. Menos de 17 discos de registro do som que tanto impacto causa na música há 50 anos: a voz e violão de João Gilberto. Mais de cinco décadas depois, o assombro e a influência que a arte de João Gilberto ainda inspira são os mesmos de quando lançou “Chega de Saudade”, de Tom Jobim e Vinicius de Moraes, em 1959. João Gilberto já sabia tudo: constantemente reinventando e evoluindo suas canções e interpretações, toda sua obra é lida como a evolução de uma sonoridade única, elaboradamente simples e infinitamente sofisticada. Logo abaixo (originalmente para o Uol em 2011, nos 80 anos de João), sua discografia comentada, do primeiro disco, lançado em 1959, até o mais recente, de 2004.


“Chega de Saudade” (1959)

Depois de participar do disco “Canção do Amor Demais” (de Elizeth Cardoso) e lançar dois 78 rotações em 1958, João Gilberto chegou à modernidade dos LPs ajudando a inventá-la. A voz íntima do ouvido, o som de violão absolutamente claro, a abordagem ao mesmo tempo casual e lapidada: eram muitos elementos novos que somavam àquele núcleo de criação exemplar. Além da remodernização de antigos sambas da década de 40 – um Dorival Caymmi, um Marino Pinto, dois Ary Barrosos -, contribui muito com o sabor de novidade a presença do produtor Tom Jobim, com três canções, seus pianos discretos e seus arranjos cheios de pequenos detalhes nas cordas e sopros, como contracantos de João.

Grande momento: “Morena boca de ouro”, releitura de um sucesso de 1941 de Ary Barroso, na voz de Silvio Caldas, aqui com o piano de Tom Jobim e a economia do arranjo impressionantes até hoje.


“O Amor, o Sorriso e a Flor” (1960)

O segundo LP de João Gilberto já começava ousado na capa, em preto-e-branco solarizado, criada por Cesar Villela, que em breve faria as famosas capas da gravadora Elenco. Gravado pouco mais de seis meses depois do primeiro disco, e novamente com direção musical de Tom Jobim, o álbum trazia no repertório seis novas canções do produtor, mais um Caymmi e um antigo sucesso nunca gravado do tempo de conjuntos vocais: “O Pato”.

Grande momento: Abrindo com vocalises que reinventam as harmonias da versão original do conjunto vocal Anjos do Inferno, de 1945, “Doralice”, de Caymmi, ganha versão definitiva com João Gilberto, em nada além de um minuto e 29 segundos. De acompanhamento, além de seu violão e leve percussão, a modernidade do piano delicado e cristalino de Tom Jobim e breves comentários da flauta no contraponto.


“João Gilberto” (1961)

No mesmo fôlego, um ano depois foi gravado o terceiro LP, homônimo, de João Gilberto. Em algumas faixas, acompanhado do conjunto do pianista Walter Wanderley, todo o resto novamente com Tom. Além de três novas do produtor, o repertório continua lembrando antigos sambas dos anos 40, desta vez com dois Caymmis, um Geraldo Pereira e um Bide/Marçal.

Grande momento: “A primeira vez”, samba de Bide e Marçal cantado por Orlando Silva em 1939, surge em versão quase invertida: o volume do original é traduzido em arranjo quase solo de voz-e-violão, apenas com o piano ocasional de Tom.


“Getz/Gilberto” (1964)

E então, o mundo descobriu. Gravado em Nova York ao lado do saxofonista estadunidense Stan Getz (e com Tom ao piano), o álbum foi lançado pela gravadora de jazz Verve e se tornou famoso em todo o planeta, ganhando cinco prêmios Grammy. Cantada pela mulher de João, Astrud, “Girl from Ipanema” saiu em single (sem a voz de João) e vendeu mais de um milhão de cópias – a canção se tornou uma das mais regravadas da história.

Grande momento: O máximo de sublime de João em disco se revela em sua interpretação de “Pra machucar meu coração”, do então recém-falecido Ary Barroso, que João muito admirava e havia acabado de conhecer. Perfeição no piano de Tom, sax de Getz, baixo e bateria de Tião Neto e Milton Banana, e João, no seu mais suave e musical.


“Getz/Gilberto II” (1964)

O primeiro disco ao vivo (ou meio) de João, gravado no Carnegie Hall em outubro de 1964, lado B de um LP com Stan Getz do outro. Na versão em CD, cinco faixas bônus trazem João e Getz juntos, com Astrud.

Grande momento: Apesar de não manter a aura de magia do encontro em estúdio, “Você e eu” ao vivo é mais um interessante encontro do violão ritmado do João com o sax jazzístico de Getz e a voz vaporosa de Astrud.


“En Mexico” (1970)

Gravado durante temporada de João Gilberto no México, como já fica claro no título, o álbum só foi gravado seis anos depois do último, e desta vez com arranjos de Oscar Castro Neves. Entre as novidades do repertório, três boleros, dois Jobins, duas autorais sem letra e uma composição de seu amigo João Donato gravada dois anos antes por Sergio Mendes: “The Frog”.

Grande momento: João canta tão próximo do microfone que sua respiração funde-se com sua voz com inigualável efeito de intimidade com o ouvinte em “Astronauta” (também conhecida como “Samba da pergunta”), só com seu violão, piano pontuando e etéreas cordas ao fundo.


“João Gilberto” (1973)

O auge do minimalismo zen de João, gravado novamente em Nova York. Desta vez acompanhado apenas do percussionista Sonny Carr e, em uma faixa, da voz de sua então nova esposa, Miúcha. Além de um Jobim, três faixas sem letra e mais alguns sambas antigos, a grande novidade são canções de Caetano Veloso e Gilberto Gil.

Grande momento: É irresistível acompanhar as harmonias vocais que João cria em contracanto com Miúcha em “Isaura”, sua versão do samba de 1945 de Francisco Alves. João, virtuose dos detalhes.


“Best of Two Worlds” (1976)

Com repertório baseado no chamado “álbum branco”, de três anos antes, traz novo encontro com Stan Getz, mais de dez anos depois do “Getz/Gilberto” original. Duas faixas são cantadas solo por Miúcha e uma novidade do repertório é “Retrato em Branco e Preto”, parceria do irmão da noiva, Chico Buarque, com Tom Jobim.

Grande momento: Cantada com serenidade e emoção por João, “Ligia” é uma novidade de Tom Jobim até hoje: João canta a primeira versão da letra, diferente da que depois ficou mais conhecida, com retoques de Chico Buarque. Getz aparece com dois solos dobrados, sobrepostos com melodias diferentes.

(Bônus momento: “É preciso perdoar“.)


“Amoroso” (1977)

Trazendo composições em inglês, italiano e espanhol e arranjos de orquestra do alemão Claus Ogerman – que havia cuidado da orquestra nos discos solo de Tom Jobim -, “Amoroso” foi desde seu lançamento recebido como momento de gala para João e é até hoje um de seus álbuns mais conceituados entre jazzistas.

Grande momento: Não é nem preciso entender a letra em italiano de “Estate” para ficar tocado com sua sensibilidade. Lendo-se, então, o “verão que criou nosso amor” e agora é um “legado de dor”, emocionante.


“João Gilberto Prado Pereira de Oliveira” (1980)

Segundo disco ao vivo de João, de um especial de TV da Rede Globo com plateia, orquestra e participações de sua filha Bebel Gilberto (então com 14 anos) e Rita Lee. Johnny Alf e Lamartine Babo são surpresas do repertório.

Grande momento: Antiga marchinha de 1939 de Lamartine Babo, cantada por Mário Reis em dueto com Mariah, “Jou Jou Balangandãs” vira pura bossa com a voz da tropicalista Rita Lee, interpretações em pura doçura.


“Brasil” (1981)

Gravado com Caetano Veloso, Gilberto Gil e Maria Bethânia: o violão de João, comentários dramáticos nas cordas e percussões e as quatro vozes se fundindo – Bethânia canta suave como nunca antes ou depois. Quase um disco conceitual sobre a Bahia, com versões de Caymmi, Ary Barroso e, novidade, Os Tincoãs.

Grande momento: Versão do standard americano “All of me” pelo letrista Haroldo Barbosa, “Disse alguém” é uma pérola, com João fazendo uma adaptação jazzística da sua batida ao violão, pequenas alterações na melodia e toda uma nova cor nas imagens em português.


“Ao Vivo em Montreux” (1986)

Terceiro disco ao vivo e um dos melhores momentos de João no palco, foi gravado – todo de voz e violão – no famoso festival de jazz suíço em 1985 e lançado em LP duplo, depois CD simples com duas músicas a menos.

Grande momento: O antigo sucesso de 1948 de Haroldo Barbosa na voz d’Os Cariocas, “Adeus América”, ganha todo um novo contexto na voz mântrica de João Gilberto, que tanto tempo morou nos Estados Unidos e havia retornado ao Brasil há pouco.


“João” (1991)

Com arranjos de cordas do americano Clare Fischer sobre a base de violão e voz de João, o disco não atinge os mesmos níveis de Amoroso, mas tem ótimo repertório, com Noel Rosa, Cole Porter, bolero, chanson.

Grande momento: João parece ter total controle sobre como fazer o tempo parar, andar para frente ou para trás em seus ritmos de violão e andamentos vocais. Em “Eu sambo mesmo”, de Janet de Almeida, cantada pelos Anjos do Inferno em 1946, o sublime é atingido já nos primeiros segundos.


“Eu Sei Que Vou Te Amar” (1994)

O quarto disco ao vivo de João e o mais sem graça, com mixagem imperfeita, edição brusca e repertório sem surpresas. “Você não sabe amar” é boa novidade.

Grande momento: “Lá vem a baiana”, de Caymmi, sempre perfeito na voz de João.


“Live at Umbria Jazz Fest” (1996/2002)

Quinto disco ao vivo de João, gravado na Itália em 1996 e lançado em CD em 2002. Mais atualizações de canções de todas as fases da carreira de João.

Grande momento: “Isto aqui o que é?”, de Ary Barroso, tão conhecida e sempre tão nova com João.


“Voz e Violão” (1999)

Produzido por Caetano Veloso, foi o último de estúdio gravado por João e o único inteiramente só de voz e violão. O repertório recupera sambas antigos de Bororó, Herivelto Martins, uma raridade de Tom Jobim, dois Caetanos e novas lapidações de “Chega de saudade” e “Desafinado”, cada vez mais sintéticas.

Grande momento: Dessa vez João Gilberto não foi tão longe, apenas 1980, para encontrar uma maravilha. “Você vai ver” foi lançada no álbum Terra Brasilis, de Tom Jobim, como uma elegante canção de fim de amor, aqui transformada em pura candura.


“In Tokyo” (2004)

País que cultua João Gilberto talvez até mais que o Brasil e recebe visitas frequentes para turnês, o Japão rendeu o mais recente disco ao vivo de João, sexto de sua carreira. Gravado em 2004, João tinha então 73 anos e faz ótima performance, tranquila e depurada.

Grande momento: Aracy de Almeida cantava “Louco” de Wilson Batista em 1946, e desde os anos 50 João a traz em seu repertório, apesar de nunca tê-la gravada em estúdio. Canta ao vivo a história do louco que chora e anda pelas ruas, transformando-se até num vagabundo.

Lulina/ Discografia Comentada

Próximo dia 9, sexta que vem, Lulina lançano MIS seu primeiro disco “oficial”, Cristalina, gravado na YB. Apesar do gosto de estréia, é seu décimo disco – os outros nove, em esquema gravado em casa, montados artesanalmente e distribuídos entre os amigos.

Aproveitando o momento, ela pula no bonde da memória e comenta cada um pra nós:

Cristalina /2009

São minhas músicas depois de tomarem banho e se arrumarem para a festa. Reúne o melhor dos 6 primeiros anos de composições e gravações caseiras, produzidas com o capricho de um estúdio maravilhoso e dos profissionais de primeira da Yb.

Aceitação do 14 e Aos 28 Anos Dei Reset na Minha Vida /2008

Retorno de saturno bombando no juízo. Aperreios de 2007 e 2008 transformados em música aos 45 do segundo tempo, em gravações limpas, apesar de caseiras. O 14 é a reflexão e o 28 é a conclusão.

Translúcida /2006

Disco de transição entre as gravações caseiras e as de estúdio, produzido em umas três noites em um quartinho dos fundos da Yb (complementado com gravações em alguns chãos de apartamentos de Perdizes e da Consolação). Foi a primeira vez que os meninos da banda participaram de gravações.

Sangue de ET /2005

Até hoje, não consigo escutar esse disco sem sentir um aperto no coração. Composto e gravado na ressaca do falecimento da minha vó, é um disco que reflete basicamente sobre perdas. Gravei sozinha, tocando quase todos os instrumentos no meu quarto, com meu laptop albino chamado Hermeto.

Bolhas na Pleura /2004

Somatizei os problemas e deu nisso: bolhas na pleura, milhões de amigdalites e otites e um disco com tudo isso musicado. Foi o primeiro álbum que deixei a produção 100% na mão do Monstro, pois eu estava tão fraca que nem tinha vontade de gravar. Os vocais do disco me lembram isso, quando escuto. Foram gravados de primeira, no comecinho de 2005 – apesar de boa parte do disco já estar pronta desde 2004 -, registrando exatamente a tristeza do momento, pois alguns deles eu gravei poucas semanas depois que minha vó faleceu. No encarte, eu dedico o disco às minhas duas avós, que foram embora no mesmo mês (a minha vó que era mais próxima de mim faleceu no dia do meu aniversário). Foi um ano bem difícil e se não fosse o Monstro, esse disco não existiria (e a capa, feita por Juliângela, é a minha preferida entre os meus discos caseiros).

Nublada em Surto /2004

Como o nome já diz, é um disco de surto em um dia nublado. Acordei no sofá do Monstro, em um carnaval com amigdalite em São Paulo, com milhões de músicas na cabeça. Liguei o computador dele, peguei meu violão desafinado e cantarolei papapás e lalalás, só para registrar as idéias. Acabou que boa parte das músicas ficou com essas letras mesmo. Composto e gravado, com a ajuda do Monstro, em pouco mais de um fim de semana, tem um clima de chapação antibiótica que eu gosto muito.

Abduzida /2003

Da selva amazônica para a selva de pedra. O abduzida é o disco que coloco quando estou triste, para poder dar umas gargalhadas. Foi o primeiro álbum que gravei em São Paulo. Aborda temas que vão da viagem que fiz à Amazônia no mesmo ano (frutas imaginárias, bubararas e seres exóticos) à minha abdução por essa cidade (cinema iraniano, quadros de Tarsila e seres exóticos). Todo gravado “ao vivo” (ligávamos o microfone de computador e colocávamos no meio da rodinha de amigos, no chão do apartamento, cada um com um instrumento em uma mão e uma lata de cerveja na outra). Sem dúvida, o mais divertido e coletivo disco que já gravei.

Cochilândia /2002

Disco recomendado para quem sofre de insônia, propositadamente longo para dar sono, gravado em madrugadas no quarto e no computador de um ex-namorado (o primeiro a me incentivar a fazer minhas gravações caseiras). Contém músicas com temas que variam entre sono, sonhos, roncos e despertadores, é o disco preferido de muitos dos meus melhores amigos.

Acoustique de France /2001

Primeiro disco que gravei, também na casa desse meu ex-namorado, onde fingíamos que eu era uma cantora brasileira que estourou na França. O álbum é como se fosse a gravação ao vivo de uma entrevista comigo em um programa de rádio francês.